Entenda por que a descriminalização não é salvo-conduto para o tráfico

Especialistas avaliam a discussão no STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) está analisando a constitucionalidade do artigo 28 da Lei 11.343/2006, também chamada Lei das Drogas. Mas, afinal o que diz esse artigo?

Porte – previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2006. Comprar, guardar ou portar drogas sem autorização para consumo próprio. Penas: I – advertência sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade; III – medida educativa de comparecimento à programa ou curso educativo.

A análise do tema começou em 2015, com o voto relator, ministro Gilmar Mendes, pela inconstitucionalidade, entendo que ele não foi objetivo em relação à distinção entre usuário e traficante. Mas Mendes não especificou que tipo de droga seria liberada. Já o ministro Edson Fachin, que também votou pela inconstitucionalidade do artigo 28, restringiu seu voto à maconha.

Oito anos depois e mais dois votos a favor da inconstitucionalidade do artigo 28, pode-se entender que há uma tendência do STF em descriminalizar o porte de maconha para uso próprio.

Mas o advogado criminalista Matheus Falivene, doutor e mestre em Direito Penal, diz que isso não significa que o tráfico – a venda ou o armazenamento para venda -, deixam de ser crime. “As atividades relacionados ao comércio de drogas continuarão a ser consideradas criminosas”.

Thaís Molina Pinheiro, especialista em Direito Penal e pós-graduada em Processo Penal, explica que a lei não tem um critério objetivo para diferenciar o porte do tráfico de drogas. Ambos os crimes englobam as condutas de adquirir, trazer consigo e guardar um entorpecente.

“Uma importante discussão que se tem travado, é a distinção entre o porte e o tráfico. Caso a lei seja derrubada, é possível que o porte de drogas para o consumo seja legalizado e que o STF estabeleça algum critério para diferenciá-lo do tráfico”, diz Thaís.

Acacio Miranda da Silva Filho, doutor em Direito Constitucional, especialista em Direito Penal, lembra que a descriminalização afetaria só o porte para uso próprio, e não os critérios para a sua determinação.

“Vale lembrar que existem critérios objetivos e, a maioria deles, subjetivos. A quantidade é um entre vários critérios. Assim, o supremo não estaria estabelecendo, como regra, o que é porte para uso próprio, só que, existindo este porte, não há crime”, diz Acacio.

As dúvidas sobre os efeitos de uma decisão favorável do STF pela descriminalização têm provocado entendimentos equivocados, como a soltura automática de condenados ou presos preventivamente por drogas, diz Leonardo Pantaleão, especialista em Direito e Processo Penal.

“No que se refere ao eventual soltura automática dos presos que possam estar no sistema prisional por conta do porte de droga para uso próprio, cuja descriminalização eventualmente geraria a saída automática, essa afirmação não guarda simetria com a realidade porque, desde 2006, a lei das drogas não pune esse crime com pena privativa de liberdade”, diz Pantaleão.

O advogado enfatiza ainda que “as outras condutas certamente continuarão tipificadas como crimes, gerando as suas responsabilidades penais”.

Fontes:

Thaís Molina Pinheiro, especialista em Direito Penal e Direito Digital, é pós-graduada em Processo Penal pela Universidade de Coimbra.

Acacio Miranda da Silva Filho, doutor em Direito Constitucional, especialista em Direito Penal, pós-graduado lato sensu em Processo Penal na Escola Paulista da Magistratura e em Direito Penal na Escola Superior do Ministério Público de São Paulo.

Leonardo Pantaleão, especialista em Direito e Processo Penal, mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP.

Matheus Falivene, doutor e mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

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