“A transmissão do vírus em transplantes de órgãos aponta para falhas no processo”
Seis pessoas testarem positivo para HIV após receberem órgãos transplantados no Rio de Janeiro. O caso é considerado sem precedentes pela Secretaria de Saúde. A investigação para apurar as responsabilidades já estão em andamento e o trabalho da perícia médica será fundamental para esclarecer as causas e a extensão do dano por cada paciente.
A transmissão do vírus por meio de transplantes, um processo que deveria ser seguro em razão dos rigorosos protocolos médicos para evitar a disseminação de doenças infecciosas, chocou o estado do Rio de Janeiro ontem (11/10), após a notícia de que pacientes foram infectados pelo HIV depois de receberem órgãos contaminados.
De acordo com especialistas, o procedimento de doação de órgãos é regulamentado para garantir a segurança tanto do doador quanto do receptor. A avaliação criteriosa do estado de saúde do doador inclui testes laboratoriais precisos e análise de seu histórico médico, com o objetivo de detectar qualquer risco de infecção, como HIV e hepatites.
A médica Caroline Daitx, especialista em medicina legal e perícia médica, pós-graduada em gestão da qualidade e segurança do paciente, ressalta que a situação atual expõe falhas em alguma etapa desses procedimentos. “A transmissão de HIV em transplantes de órgãos aponta para falhas no processo, que pode incluir desde a janela imunológica — fase inicial da infecção em que o HIV pode não ser detectado — até falhas humanas e administrativas”, afirma.
Em relação às vítimas, a perícia médica terá papel essencial para avaliar o impacto do erro médico em cada paciente. Daitx explica que “cada caso será tratado individualmente para determinar a extensão dos danos. No caso do paciente que recebeu um transplante hepático e faleceu, será necessário verificar se o HIV influenciou na causa da morte. Quanto aos pacientes que receberam transplantes renais, a análise incluirá as repercussões atuais da infecção e as possíveis consequências futuras.”
Investigações detalhadas serão realizadas para verificar se houve falhas no diagnóstico laboratorial ou na interpretação dos resultados, assim como erros na coleta do histórico médico do doador. A cronologia dos eventos clínicos também será analisada para determinar se o HIV foi o fator determinante nas complicações de saúde ou no falecimento de um dos pacientes transplantados.
O impacto desse episódio pode ser devastador não só para as vítimas e familiares, mas também para a credibilidade do sistema de transplantes no país. “Esses tipos de incidentes expõem a importância de se seguir à risca os protocolos de segurança. A perícia vai apurar as responsabilidades, mas é imprescindível que o caso em questão sirva como alerta para evitar erros como esse voltem a ocorrer”, conclui Daitx.
Fonte: Caroline Daitx: médica especialista em medicina legal e perícia médica. Possui residência em Medicina Legal e Perícia Médica pela Universidade de São Paulo (USP). Atuou como médica concursada na polícia científica do Paraná e foi diretora científica da Associação dos Médicos Legistas do Paraná. Pós-graduada em gestão da qualidade e segurança do paciente. Atua como médica perita particular e promove cursos para médicos e advogados sobre medicina legal e perícia médica.